quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Relato Incidentes no Pico do Baiano

Pessoal,

Transcrevo aqui o relato de dois incidentes ocorridos no Pico do Baiano, em Catas Altas - MG (email enviado pelo Luís Monteiro à lista da FEMEMG).

"---------- Forwarded message ----------
From: Lugoma <luis_solar@yahoo.com>
Date: 2011/9/14
Subject: [FEMEMG] Re: Incidentes no Baiano
To: fememg@yahoogrupos.com.br

Tigrão e Demais,

Os dois incidentes na região do Baiano ocorreram comigo e felizmente, "no final das contas", tudo correu bem, na minha opinião, devido aos procedimentos e decisões tomadas pelos presentes nos fatos que irei relatar apesar de eu ter "herdado" duas "luxações"(aparentemente não muito graves, mas cuja a dor é absurda no momento da lesão ) no ombro direito mais precisamente na Cabeça do Úmero e Escápula. Bem...conforme já mencionado, o primeiro incidente ocorreu em Agosto, na trilha rumo área de escalada tradicional denominada de "Procissão das Almas" onde estão localizadas belas e imponentes Agulhas como: Frade, Papai Noel, Elvis, Pontão Maior e etc, nesse dia Eu, Edgardo Abreu(KK) e Alexandre(Caverna) estávamos indo iniciar a conquista da Agulha do Pontão Maior até então cume virgem na região. Em nossas mochilas carregarramos além dos tradicionais equipamentos móveis(jogos de "friends", nuts e cia Ltda), diga-se de passagem essenciais para quem queira se aventurar pelas fendas da região, equipamento de conquista, bivaque, cordas, comida e etc enfim, estávamos "armados até os dentes" com média de peso de 22 Kg cada mochila (pesadas, democraticamente, com precisão no "posto de controle", ou seja, no Abrigo do Caverna). O dia estava muito favorável e prometia uma grande escalada, porém, em um determinado trecho de escalaminhada, após cruzar um riacho e subir em um platô, uma agarra de mão quebrou na minha mão esquerda e no reflexo, com o meu braço direito totalmente esticado, tentei agarrar outra agarra, porém, devido ao peso da mochila, perdi o equilíbrio e cai batendo o braço direito nas pedras. Cabe salientar que meu ombro direito saiu do lugar (ele nunca tinha saído do lugar ao longo de todos os meus anos de montanhismo)na tentativa de agarrar algo e não pelo impacto nas pedras. Bem... Com a queda e deslocamento do ombro e com isso, muita dor, logo KK e Caverna vieram ao meu socorro liberando minha mochila, e me colocando em uma posição mais confortável. Logo KK e Caverna imobilizaram meu braço com fitas e mosquetões criando assim, uma "tipóia" e o Caverna ligou para o Robalo e Teco (Montanhistas nativos do Morro da Água Quente) para ajudar na minha remoção. Logo, os dois chegaram e como não tinha batido a cabeça e nem outra parte do meu corpo, estava totalmente em condições de voltar para o Abrigo andando, sem mochila claro, com o apoio dos meus amigos. Chegamos no Abrigo e logo pegamos o carro e nossa intenção era voltar para BH e ter atendimento em um hospital com boa infra-estrutura porém, a medida que o tempo passava a dor aumentava, e tomamos a decisão de ir para Barão de Cocais onde fui prontamente atendido no hospital da cidade. Foram necessários, dois enfermeiros, Caverna e mais um médico(clinico geral) além do KK, dando apoio moral, para voltar meu ombro no lugar que após alguns minutos de sofrimento finalmente o bendito voltou ao lugar e o alivio foi praticamente instantâneo. Bom...o segundo incidente ocorreu nesse último final de semana na mesma região porém, em ambiente vertical e já bem isolado do Morro da Água Quente. Estávamos realizando a conquista do Pontão Maior(Eu, KK, Caverna e também Gustavo Ferraz) quando a aproximadamente 100 metros de altura, onde se encontra um ótimo platô para bivaque, cheguei na parada quando em um simples movimento de domínio para ficar em pé no platô, meu ombro direito saiu novamente. É importante salientar que antes de realizar o lance do domínio de acesso ao platô, aliás muito fácil(3º máx), por prudência pois "o seguro morreu de velho", fiz um "backup" com meu jumar em uma corda que havia sido também fixada pelo KK no Platô acima. Com a saída do meu ombro cai porém, estava preso a corda fixa no platô que prudentemente havia me ancorado segundos antes. Bem...a partir daí vivemos um pequeno drama e decisões sábias e rápidas foram tomadas. A primeira delas foi manter a calma, a segunda foi avisar ao Caverna que se encontrava uma parada abaixo o que havia ocorrido e ele, por estar de celular, entrar em contato com montanhistas que conhecem bem o local onde estávamos para um possível resgate e terceira, por já conhecer a dor de um deslocamento de ombro e saber o que vêm pela frente, ou seja, muita dor a medida que o corpo esfria além de rapeis e uma longa trilha em terreno de montanha (com trechos de escalaminhadas e penhascos) tínhamos que tentar fazer a manobra de torção para tentar voltar o ombro em seu devido lugar. Sabíamos dos riscos de aumentar a lesão ou coisa pior, caso mal executada, por se tratar de uma manobra delicada porém, assumi o risco pois se tudo desse certo sabíamos também, que o "paraíso" teríamos alcançado! Pois bem...enquanto Caverna entrava em contato com o Tigrão pelo celular e o mesmo eficazmente entrava em contato com outros montanhistas, dispostos a tentar um resgate, e também com o corpo de bombeiros. Gustavo e KK se esforçavam, de forma fria, porém, bem calma, uma posição para realizarem a manobra. Finalmente, após confiarmos uns nos outros, "relaxei" o meu braço e KK e Gustavo realizaram a manobra com grande perfeição! Enfim... a Cabeça do Úmero tinha voltado a sua casa... dentro da região da Escápula. Bem...se tivemos sorte...não sabemos, mas posso afirmar que a confiança e a seriedade com que foi encarada a situação por todos acredito que foi o ponto forte para o sucesso. Bom...após a volta do ombro houve um momento de grande relaxamento e decidimos passar a noite no platô pois já estava escurecendo e o pior tinha passado. No dia seguinte, estava sentido bem com pouca dor. E pedi que os outros continuassem a conquista pois ficaria bem no platô. Enquanto KK e Gustavo terminaram a conquista chegando ao cume do Pontão Maior do Procissão das Almas(Patagônia Mineira) às 13:30 hs do dia 11/09. Eu e o Caverna (que ficou comigo no platô) "apreciávamos"(de coração apertado) o combate ao fogo por helicópteros, aviões e brigadistas nas barbas do Baiano e Catas Altas. KK e Gustavo retornaram ao Platô às 14:30 hs e todo o cuidado foi tomado para realizar o meu rapel e volta pela trilha montanha abaixo. Chegamos ao "lar doce lar"(Abrigo Caverna) às 18:30 hs e saimos para comemorar não somente o cume conquistado (pela via "Escapuliu Doutor" (200 mts, 5º(6º Sup)E2 no melhor estilo, ou seja, toda em móvel) como também a grande roubada que havíamos nos livrados. Bom...tentei nesse breve relato ser o mais fiel e sincero possível nos acontecimentos ocorridos recentemente na região do Baiano de forma a tentar contribuir com o GEPAM e também ajudar na prevenção de novos acidentes/incidentes. Cabe salientar, que nesses dois episódios todos os envolvidos mantiveram a calma e na minha humilde opinião, realizaram o que tinha de melhor para ser realizado naquele momento. Um outro ponto importante que particularmente constatei foi a agilidade na organização de um possível resgate com acionamentos de montanhistas que conhecem a região e dispostos a encarar em conjunto com o corpo de bombeiros com prudência (assumindo os riscos do ambiente) a "missão" portanto, agradeço ao Tigrão, Marquinhos e Guilherme pela disponibilidade e presteza e também ao corpo de bombeiros que foram solícitos e disponibilizaram toda a sua infra-estrutura (inclusive se necessário helicóptero). Além disso, gostaria de agradecer ao Robalo, Teco (também dispostos a enfrentar o possível resgate) e a Gisele(esposa do Caverna). Não poderia deixar de reconhecer e agradecer também o verdadeiro espírito de montanha, ou seja, amizade e companheirismo com meus amigos de cordadas portanto, KK, Caverna e Gustavo meu muito obrigado. Bom...para terminar gostaria de enfatizar o que Breno (Raxa Cuca) salientou bem . Poucos foram os incidentes, com o montanhismo, que ocorreram na região do Caraça ao longo de sua história. Ninguém se machucou serio nem foi omisso lá até então pelo contrário, a imponência natural da região impõem certas regras e condutas a todos que de certa forma se aventuram não somente nas escaladas épicas disponíveis por lá como também em suas belas travessias portanto, os montanhistas que freqüentam a região sabem da responsabilidade e compromisso necessários para encarar os desafios propostos pela Serra do Caraça portanto, não somente preparo físico, mental e logística são importantes mas também respeito a ética, a comunidade local e sua cultura e principalmente respeito ao meio ambiente, às montanhas. Com a humildade, Respeito e a união entre os montanhistas é que tornaram até os dias de hoje, na minha opinião, as aventuras nessa bela região de certa forma "mais segura" em todos esses anos.

Bons VentosLuis Monteiro (Lugoma)

ps: Peço desculpas aos ortopedistas e fisioterapeutas de plantão caso tenha falado algum termo técnico errado nesse relato."

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